22.11.13

Ricardo e o panda

Ricardo acordou em um deserto.
Assustado, levantou sobressaltado, cuspindo areia e chacoalhando a cabeça. “Como eu vim parar aqui?”. Ele ainda estava zonzo, com dificuldades para se lembrar do que havia acontecido. Aos poucos as imagens vinham à sua mente, primeiro em flashes, depois em cenas, até que se lembrou de tudo. Mas ter lembrado não respondia a pergunta: “Como eu vim parar aqui?”.
Eles estava indo para São Paulo. Eram quase três da madrugada quando ele foi até a cabine do motorista para fumar. Estavam conversando trivialidades quando uma luz surgiu do nada e o ônibus bateu. Ricardo sentiu o impacto e seu corpo sendo arremessado para a frente... e depois acordou no deserto.
Se ele estivesse no norte do país, poderia cogitar a possibilidade de ter caído nos lençóis de areia, mas a menos que ele estivesse estupidamente enganado, não deveria haver nada como aquele lugar no norte do Paraná.
Ricardo levantou-se, bateu a areia das roupas e observou em volta. Não havia nada. Suas roupas e seu corpo estavam inteiros. Pela violência da batida, ele não deveria estar nem vivo. “É isso! Será que eu morri? Mas isso é o inferno ou o céu? De repente é o purgatório, e vou ficar aqui torrando no sol pra expiar meus pecados. Mas que merda!”
Resolveu se beliscar, e sentiu dor. Achou estranho, mas não impossível. Em seus bolsos ainda levava sua carteira e seu celular, que por sinal, estava sem sinal. No céu, nada além de um azul irritante. Mas bem lá ao longe, podia ver algumas nuvens. “Se lá tem umidade, vou pra lá”. Caminhou por muitas e muitas horas, até que algo lhe chamou a atenção. Portas. Várias delas. Sem construção, apenas as portas em pé. Ficou em duvida se aquilo seria uma porta como na Torre Negra de Stephen King ou algo mais no estilo Looney Toones. Não havia parede alguma, nem cordas nem nada que as segurasse. Ricardo circulou a porta, por todos os lados, e ela continuou lá, em pé, imóvel. Pensou que se abrisse ela, veria apenas o outro lado. Girou a maçaneta e puxou.
Quando a porta abriu, Ricardo pode ver o interior de uma casa. Sentado à mesa, um panda tomava café. Ele o olhou com dúvida, e o homem fechou a porta com força, assustado. Esperou seu coração desacelerar e mais uma vez olhou atrás da porta. Nada, apenas areia. Tomou coragem e novamente girou a maçaneta.
O panda agora estava virado de frente para a porta. Segurava um grande canecão de metal com a palavra COFEE estampada. Podia sentir o cheiro da bebida. Café preto. “É como um canecão da oktoberfest”. O urso não se movia. Apenas observava Ricardo com curiosidade. Seu barrigão oscilando conforme respirava, o banquinho de madeira tremendo por conta de seu peso. Como mais nada naquele lugar fazia sentido, resolveu entrar na casa. Acenou uma vez para o morador, que respondeu o gesto, de forma vagarosa. A cabeça do animal (animal?) estava inclinada. Ele parecia tão intrigado quanto o rapaz. Ricardo circulou pelo lugar e reconheceu aquele apartamento. Era o seu apartamento. Todos os porta-retratos e objetos de decoração dele estavam ali. A vitrola, a televisão, o vídeo-game, a maquina de costura, tudo ali. Ricardo chegou perto para observar as fotos e então tomou um susto. Eram as fotos dele, mas nos retratos onde ele deveria aparecer, estava o panda!
Ricardo paralisou. Algo de muito errado estava acontecendo. Vasculhou o imóvel, e no mais, tudo estava igual a sua casa. Aquela era sua residência, sem duvidas.
Voltou para a copa e fitou novamente o panda. Ele ainda estava lá. Caminhou até ele e esticou o braço, tocando o urso na cabeça. O panda fechou os olhos, sentindo o toque.
Ricardo deu meia volta e pegou uma caneca. Suspirou e colocou duas colheres de açúcar. Teria realmente morrido? Não tinha nenhum arranhão, então poderia ter realmente passado daquela para a melhor. Mas esse mundo era estranho demais. Talvez tivesse batido a cabeça e enlouquecido.
Cansado, puxou um dos bancos e encheu a caneca com café.

2 comentários:

  1. Gostei muito do começo, realmente aguçou a curiosidade. Só achei que o final não correspondeu à qualidade do resto do texto.

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