31.5.15

Uma noite solitária de sábado

    Numa solitária noite de sábado, dopado por antigripais e remédios para dor de cabeça, o rapaz liga a tv em um canal qualquer, e está passando Superman - O retorno, e em seguida, Lanterna verde. Ele dá uma bufada e se desconecta.

    Tem aquela sensação típica de quem está entediado: vontade de fazer alguma coisa, mas nada pra fazer. Porém, cum um leve giro de cabeça pelo quarto, ele pode ver pelo menos uma meia-dúzia de     coisas para se ocupar. Mas destas, ele não quer saber.

    Para e ouve os sons da rua. De vez em quando um carro passa em uma velocidade absurda para uma rua de área residencial. A rua fica perto da rodovia, e talvez alguns motoristas não saibam onde começa uma e termina outra, coitadinhos.

    A menos de trinta metros dali, uma lanchonete paira na esquina. Não tem nem um ano em que o ele mora na quitinete, e ele já está acompanhando as desventuras do terceiro gerente do lugar. Simplesmente não tem movimento. É um bairro que tem 1) Pessoas com algum dinheiro mas não frequentam o lugar, e 2) pessoas pobres que, obviamente, também não frequentam o lugar. A questão é que o ultimo dono fez um grande investimento. Colocou fachada luminosa e deu uma nova pintura. Tudo muito bonito, de fato, mas não vai adiantar. Agora o rapaz ouve uma dupla de cantores ruins entoando sertanejos de todas as épocas possíveis com o acompanhamento de um violão. Na falta de talento, um dos rapazes berra, na esperança de atingir a nota correta. Quando olhou de sua janela na ultima vez, haviam oito pessoas nas mesas.  Três delas eram o novo dono e sua equipe.
    
    Isso o fez pensar em algumas horas atrás quando estava no shopping. Existe um tipo pior de cantor de barzinho. É aquele cara que não tem talento nem criatividade, então, canta musicas de inúmeros artistas. Não contente, ele canta as musicas de tais artistas de uma forma descompassada e sem ritmo, pensando estar inovando, estar sendo inventivo. A única coisa que as pessoas poderiam tentar fazer, que é cantar junto com o pretenso artista, se torna impossível. Patético.

    Mais triste que a situação da lanchonete, é a do bar, logo em frente, na outra esquina. Este, ao contrario, está cheio. Universitários adoram pensar no bar como um local de livre pensar, com cerveja barata, garotas bonitas e musica interessante. É a falsa idéia de boemia, coisa de burguês. Pode até ser verdade, mas passa longe do que é um boteco de bairro, no meio do nada. Os homens que estão ali não estão batendo papo, só estão enchendo a cara. Alguns se divertem, jogam sinuca e vão pra casa numa boa. Mas com certeza, pelo menos um dos alcoólatras dali vai chegar em casa e seguir o roteiro: Abrir a porta aos trancos. Abrir a geladeira procurando algo pra comer. Acordar a mulher, as três da manha, mandando ela fazer alguma coisa pra ele comer. Ela o manda à merda. Ele tropeça até o quarto e a puxa pelos cabelos, dizendo que quando ele manda, ela obedece. Ela chora e faz um omelete qualquer com boas doses de cuspe enquanto ele vomita no banheiro. Ele vem, come sem saborear e vai pra cama, onde ela soluça e remói. Ele vai pegar a mão dela e apertar sobre seu pinto. Ela vai tirar rápido e o mandar fazer bom uso de seu rabo. Ele vai dar uma cotovelada nas costas dela, deitar de lado e dormir.

    Nada boêmio. Nada poético.

    Que Deus me livre de um dia ter que ganhar a vida vendendo a tristeza por litro. Longe do bar, tantas e tantas pessoas passam frio em seus casebres, arrasados pela ultima enchente. Alguns provavelmente passando fome. Uma boa quantidade de pessoas do bairro não passa por estes apertos, mas está igualmente infeliz, por outros motivos. Cada pessoa tem sua cela particular no inferno da mente.

    O rapaz olha para a tv e se contenta. Para de reclamar. O lanterna verde é um bom personagem, da pra ver o filme. Podia ser pior.


    Podia ser crepúsculo.

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