Por cinquenta anos a paisagem de nossa cidade continuou quase a mesma, apenas com umas lâmpadas aparecendo aqui e ali, mas nada de tão importante.
As habitações humanas sofreram algumas mudanças. Em períodos regulares os homens mudavam a fachada, as cores e os nomes de suas construções e estabelecimentos. Era um espetáculo interessante.
As pessoas caminhavam pelas ruas e dividiam os espaço com alguns cães vadios e vendedores ambulantes.
As pessoas caminhavam pelas ruas e dividiam os espaço com alguns cães vadios e vendedores ambulantes.
Porém as coisas mudaram como se fossem um teatro: com um fechar e abrir de cortinas, o palco se altera por completo.
Começou com os veículos. Magníficos cavalos foram sendo substituidos aos poucos por caixas de lata vermelhas que levavam várias pessoas por viagem. As pessoas não caminham mais. Correm, como se fugissem de monstros medonhos. Os humanos tornaram-se escravos de um objeto chamado relógio, que controla todos os âmbitos de sua vida. As cores foram perdendo sua variabilidade e começaram a assumir um padrão neutro. De toda forma, não faz sentido pintar as construções porque a fuligem industrial e automobilística tingirá tudo de cinza-triste. Minhas irmãs foram mortas, os pássaros se mudaram, os mangues foram loteados e o aroma das flores sucumbe ao gás carbônico.
Mas o que mais me entristece, mais até do que a morte de minhãs irmãs, é a falta que as crianças me fazem. Por gerações as crianças subiam em meu corpo e eu era como um universo paralelo para elas. Cada um de meus grandes galhos era o 'reino' de algum moleque, meus galhos menores eram arrancados pra virarem espadas e rifles, minhas folhas viravam barquinhos. Claro que doía um pouco, mas ouvir as historias delas e ver seus sorrisos compensavam toda a dor. Essas crianças cresciam, e quando enamoravam-se, gravavam com uma faca seus nomes em meu casco. Também doía, mas quem pode julgar o amor? Eu não me importava. Guardo em mim a assinatura de uma boa quantidade de felizes casais. Depois de adultos, aquelas crianças encostavam-se em mim para ler, relembravam os momentos da infância e tinham carinho por mim.
E hoje, o que as crianças estão fazendo? Por que aquela caixa plástica é mais atrativa do que eu? Ao invés de inventar aventuras, as crianças vivem aventuras feitas por outros. Elas gostam de me ver em fotos, mas nem me tocam quando passam por mim. Estão se tornando reclusas, introspectivas, pegando cada vez menos sol. Quantas dessa nova geração já subiram em mim? Os pais até tentam influenciá-las a me escalar, mas desistem quando as crianças abrem o berreiro pra voltar ao computador. O que o mundo se tornará, se as crianças nem sabem mais o que significa 'mundo'? Sabem do mundo virtual. Do mundo real, são ignorantes.
No fim, meu desabafo não valerá de nada. Alguma máquina irá me serrar e meu corpo irá transformar-se em alguns bancos ou mesas. A diferença é que, ao contrário de minhas irmãs, ninguém sentirá minha falta. Eu gostaria de ter morrido naquela época feliz.
Mas o que mais me entristece, mais até do que a morte de minhãs irmãs, é a falta que as crianças me fazem. Por gerações as crianças subiam em meu corpo e eu era como um universo paralelo para elas. Cada um de meus grandes galhos era o 'reino' de algum moleque, meus galhos menores eram arrancados pra virarem espadas e rifles, minhas folhas viravam barquinhos. Claro que doía um pouco, mas ouvir as historias delas e ver seus sorrisos compensavam toda a dor. Essas crianças cresciam, e quando enamoravam-se, gravavam com uma faca seus nomes em meu casco. Também doía, mas quem pode julgar o amor? Eu não me importava. Guardo em mim a assinatura de uma boa quantidade de felizes casais. Depois de adultos, aquelas crianças encostavam-se em mim para ler, relembravam os momentos da infância e tinham carinho por mim.
E hoje, o que as crianças estão fazendo? Por que aquela caixa plástica é mais atrativa do que eu? Ao invés de inventar aventuras, as crianças vivem aventuras feitas por outros. Elas gostam de me ver em fotos, mas nem me tocam quando passam por mim. Estão se tornando reclusas, introspectivas, pegando cada vez menos sol. Quantas dessa nova geração já subiram em mim? Os pais até tentam influenciá-las a me escalar, mas desistem quando as crianças abrem o berreiro pra voltar ao computador. O que o mundo se tornará, se as crianças nem sabem mais o que significa 'mundo'? Sabem do mundo virtual. Do mundo real, são ignorantes.
No fim, meu desabafo não valerá de nada. Alguma máquina irá me serrar e meu corpo irá transformar-se em alguns bancos ou mesas. A diferença é que, ao contrário de minhas irmãs, ninguém sentirá minha falta. Eu gostaria de ter morrido naquela época feliz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário