Então
diga-me, há no mundo guerreiro mais carregado de infortúnio do que este que vos
fala?
Por
terras ermas caminhei durante dois longos anos. Enfrentei criaturas vis, que
causaram-me pavor apenas por sua presença. Muitas vezes combati, mas tantas
outras foram as vezes em que bati em retirada, verdade seja dita.
Nevascas
e tempestades de areia assolaram-me, assaltantes abateram-se sobre mim e minha
montaria, saudoso Aelir, foi picado por uma víbora. E depois de tantas
intempéries, de tantos momentos penosos e sofríveis, cheguei ao meu destino.
Uma
mata fechada cercava o castelo, mas com um pouco de fogo e minha espada, venci
a hera que se fechava ao redor da construção. Seus espinhos venenosos rasgaram
minhas vestes, mas minha cota de malha protegeu-me de cair em tal armadilha. No
castelo, tudo dormia. Animais, serviçais, soldados e cortesãos. E no último
andar, lá estava ela, a mulher mais maravilhosa que qualquer olho humano já
pôde observar. Aproximei-me dela, e sem pestanejar, dei-lhe um beijo. Nada
aconteceu.
Minha
confusão só fazia crescer. Não era esta a lenda? “Em sono profundo cairá, fruto
de um ferimento casual em um fuso, e tudo ao seu redor adormecerá. Apenas
quando um beijo de amor verdadeiro receber, a vida novamente acontecerá.” Mas e
porque então? Comecei a pensar no que poderia estar errado, e quase
enraiveci-me daquela que ali dormia. “Será que ela não me aceitou?” pensei.
Revi todos os passos que me levaram até ali e não encontrei nenhum erro em
minha conduta que pudesse quebrar o efeito do cumprimento da magia. Percebi
então o que me faltava para cumprir a missão, e vi que era algo simples, e ao
mesmo tempo complexo: faltava amor. Eu nunca tinha visto a dama antes, mas confesso
que ela ultrapassa os níveis comuns da beleza. Fiquei muito atraído por ela,
mas eu não a amava.
E
agora, que fazer? Bem, o que fiz foi pernoitar durante aquela noite no castelo.
Na manhã seguinte, preparei minhas coisas para partir, enraivecido por tão
grande perca de tempo. Mas, por algum motivo, olhei para trás, para ela, e
fiquei algum tempo observando seus traços. Sua pele era macia, e seu rosto
carregava um ar de fortitude e graça. Resolvi que ficaria por ali mais alguns
dias. O tempo foi passando e fui me afeiçoando ao lugar. Passei a dar nomes aos
adormecidos e a conversar com eles. Principalmente com ela. Lhe contei tudo que
já tinha feito em minha vida. Muitas vezes discutimos, mas quando ela fica
brava parava de me responder. Há há! Ahm, bem, desculpem-me pela piada.
Enfim,
os anos foram passando, e percebi que não conseguiria mais sair dali. Não
conseguiria mais deixa-la. Tentei algumas vezes, mas sempre voltei. Alguns
saqueadores conseguiram entrar no castelo, mas não deixei que saíssem com vida.
E assim passaram-se dez ótimos anos. Até que um dia, aos prantos, fiz-lhe uma
declaração e dei-lhe outro beijo. Desta vez, ela acordou.
Fiquei
extremamente feliz, meus olhos brilhavam. Porém, ela me deu um tapa
extremamente dolorido, e berrava “quem é você? Que lugar é esse? Papai! Papai!”
Logo,
o rei veio de algum lugar, pois ele e todos os seres do castelo voltaram a
abrir os olhos. Sua Majestade explicou à princesa sobre a maldição. Porém, ela
me pediu desculpas, e disse que não me amava. Não ainda.
Então
vejam o meu azar! Passo anos pra conseguir amar a moça de verdade, e quando me
vejo perdido por ela, não sou correspondido!
Passei
e integrar a corte do castelo e a servir nas fileiras do exercito. A princesa
me olha de um jeito diferente, como que em duvida sobre mim. Talvez, ela tenha
ouvido as coisas que lhe falei enquanto dormia. Ela me disse em algumas
conversas que durante a noite sonha com determinadas situações que, em meu
íntimo, sei que fui eu quem lhe contou. Temos conversado bastante, e talvez o
sol brilhe outra vez em meu horizonte. Mas por enquanto, minha tristeza tem
sido grande, e minha saudade também. Ponha-se no meu lugar, e pense em como
devo sentir-me por não mais poder observar minha bela enquanto sonha? É triste,
mas ainda tenho esperança, e ainda guardo em minha boca o toque de seus lábios.
Deus queira que um dia possa eu tocá-los outra vez.
Nenhum comentário:
Postar um comentário