De longe ele observa
seu povo avançando. Uma multidão se arrasta por alguns quilômetros, deixando
para trás os pertences que se mostram pesados demais. Ele acena, pedindo mais
pressa, pois não sabe por quanto tempo poderá segurar as muralhas de água separadas.
Está calor, mesmo no fim da tarde.
Ele olha para a margem
que deixaram e vê uma nuvem de areia se erguendo no horizonte. O Libertador se
preocupa; teme que sejam os soldados do rei que estejam vindo em seu encalço.
A população sob seu
comando está quase toda na margem segura, mas o perigo ainda existe, e muitos
ainda não atravessaram a passagem.
Ele percebe que há algo
errado. Alguma energia negativa paira no ar, e ele não sabe de onde vem. O
Libertador procura na margem e nos céus qualquer indicio de que algo errado
esteja acontecendo, mas não encontra nada. Nas muralhas de água também não há
nada de diferente, apenas os peixes nadando de um lado para o outro. Mas ele
sabe, pode sentir na pele que tem algum fator estranho interferindo na energia do
lugar. Ele fecha os olhos e ergue o rosto. Pode sentir o tímido sol de fim de
tarde tocando sua pele. Olha para seu povo novamente, e calcula que faltem
apenas umas cinquenta famílias para atravessar o vale.
Porém alguma coisa chama
sua atenção. Algo assusta os peixes, e de dentro da água, uma sombra começa a
se aproximar. Uma sombra grande. O Libertador pensa em algum tubarão, talvez
uma baleia. Sabe da existência dessas criaturas, mas nunca soubera de alguma
delas nadando por estes mares. A criatura se aproxima o suficiente e para ao
avistar o Libertador. É um polvo gigante, com olhos negros e profundos, com
tentáculos gigantescos e narinas enormes. Pode-se perceber que seu corpo
continua a estender-se por muitos e muitos metros. Mais perturbador que sua própria
forma é o monstro estar estático, como pedra.
O Libertador sente uma onda
de maldade atingir-lhe como se fosse uma pancada, e o terror começa a
invadir-lhe o coração. Ele se segura em seu cajado e pensa em que atitude
tomar. Consegue tirar os olhos do monstro, que permanece imóvel, e olha para a
margem que ele e seu povo haviam deixado para trás. A nuvem de poeira vai
ficando cada vez maior e mais próxima, mas não é só isso, há outra coisa.
Parados no limiar do
leito marinho, três homens observam. Suas peles são azuladas e suas vestes são
negras. O Libertador não consegue saber se são humanos pintados ou se são outra
coisa qualquer. Assim como o monstro, os três seres ficam imóveis como estatuas,
e mais uma vez o Libertador sente o mal chegar-lhe como se fosse algo palpável.
À sua frente, uma criatura tão enorme quanto a esfinge do rei, e na beira do
mar, três homens tão estranhos quanto qualquer coisa que ele já tenha visto. Ao
que parece, as pessoas de seu grande grupo não perceberam as presenças
aterradoras que se apresentaram. Estavam mais preocupadas em sair do vale de
águas e alcançar a terra segura. O Libertador recobrou sua calma. Encarou os
seres que só ele via e em sua mente começou a entoar uma prece.
Porém, a situação
parecia piorar cada vez mais. Cruzando a linha da visão, inúmeros carros de
guerra eclodem da nuvem de areia e começam a descer as dunas do horizonte e,
numa velocidade incrível, adentram o vale das águas, com espadas e lanças
empunhadas e disparando flechas. O Libertador grita para que seu povo se
apresse, pois os soldados do rei haviam chegado. Temeroso, ele observa a
torrente de guerreiros que aflui para dentro do caminho entreáguas, e percebe
que os homens azuis começam a fazer gestos ritmados. Balançam as mãos e
ajoelham-se em reverencia, fitando as águas do mar. Ainda orando, o Libertador
observa a criatura marinha, e vê seus olhos brilham. De trás da cabeça do
monstro, um gigantesco braço surge e uma mão avança na direção do Libertador,
cada dedo do tamanho de três homens. Numa rápida movimentação de olhos, ele
percebe que são os homens azuis que tem o poder de liberar a força do monstro.
Resignado, o Libertador ajoelha-se e pede a seu Deus que lhe dê uma morte
rápida e poupe seu povo.
Ele espera o toque do
monstro, mas nada acontece. Quando abre os olhos, percebe que o polvo observa
os céus. Olhando para a margem, vê que os homens azuis também olham para o
alto. Nuvens giram em torno de si mesmas, adquirindo aos poucos uma tonalidade
avermelhada. Os soldados do rei continuam avançando, e a linha de frente já
alcança a metade do caminho. Uma flecha cai aos pés do Libertador.
Então, vindo das nuvens,
uma torre de fogo se ergue na entrada do vale, impedindo a passagem dos
soldados. O Libertador entende o sinal e dá graças a seu Deus. Sobe o restante
do caminho atrás dos últimos homens de seu povo, e junto com eles assiste a
obra de seu Senhor que lhes salva. Ele é o único que vê o monstro nadar de
volta para onde veio, e os homens azuis caminharem vagarosamente na orla da
margem oposta, indo para algum outro lugar. Derrotados.
O Libertador não sabe
de onde vieram, mas sabe que eram feitos de puro mal. Os soldados que já tinham
cruzado a passagem começam a se aproximar. Ele não é nenhum assassino, mas não
pode deixar que seu povo seja afligido pelos inimigos. Com o poder que lhe foi
concedido, estende as mãos e o mar fecha-se novamente, engolindo os soldados em
seu abraço estrondoso. Ele assiste a cena com tristeza. Enquanto seu povo
começa a se retirar, ele ainda fica observando o mar. Pode ver o pilar de fogo
se dissipando. Pode ver alguns soldados tentando nadar até uma das margens,
assim como seus cavalos. Mas lentamente, um a um, soldados e cavalos são
envolvidos por tentáculos enormes e arrastados para os confins do oceano.
Aterrorizado, o
Libertador ajoelha-se e agradece ao seu Senhor por ter lhe dado tão grande
livramento.
Caramba, voce conseguiu juntar o Cthulhu, os caras do hellraiser e a biblia. Que drogas voce uso? Parabens
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